Advogado alerta sobre necessidade de propostas atrativas para captar recursos para modalidades
A regulamentação das apostas esportivas no Brasil abriu um novo ciclo de investimentos de bets no esporte nacional, mas esse capital ainda está concentrado quase exclusivamente no futebol. O advogado José Francisco Manssur, sócio do escritório CSMV Advogados e ex-assessor especial da Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda, que esteve à frente da elaboração das regras para o setor de apostas, defende que essas empresas direcionem recursos também para esportes olímpicos.
Manssur abordou o tema durante sua palestra no CBC & Clubes EXPO, evento realizado em Campinas (SP) que reúne dirigentes de clubes esportivos, patrocinadores e especialistas do setor. Para ele, as casas de apostas têm um “apetite como há tempos não se via” para patrocinar o esporte, mas os dirigentes das modalidades olímpicas precisam apresentar propostas mais atrativas para captar esses recursos.
“Elas têm apetite para patrocinar o esporte como há tempos não se via. Só que essas empresas estão indo no automático, se juntando aos times de futebol. As entidades olímpicas, clubes e etc. precisam fazer seu trabalho de marketing para mostrar às Bets o benefício para elas, para as marcas, de investir em outros esportes. As Bets têm dinheiro para investir no futebol e nos olímpicos. Se conhecerem o que os olímpicos fazem, as mobilizações, o trabalho na formação de atletas e etc., há grandes argumentos para ter esse dinheiro também. Está faltando iniciativa”, afirmou Manssur.
Sumário
Setor movimenta bilhões no Brasil
Manssur apresentou dados que dimensionam o crescimento exponencial do setor de apostas esportivas no Brasil. Segundo ele, o mercado de apostas online cresceu 734,6% entre 2021 e abril de 2024 e já movimenta R$ 6 bilhões em apostas e jogos online, representando 1% do PIB brasileiro.
O especialista também revelou que, no primeiro trimestre de 2024, as plataformas de apostas online registraram 1,992 bilhão de acessos. Um estudo da SimilarWeb apontou que, em 2022, sites de apostas somaram 14,2 bilhões de acessos no mundo, sendo que o Brasil lidera o ranking global com 3,2 bilhões de acessos, quase 25% do total. Reino Unido e Nigéria completam o pódio.
Apostas dominam futebol
O impacto das Bets no futebol brasileiro é evidente. Todos os clubes da Série B do Campeonato Brasileiro contam com patrocínio de casas de apostas, enquanto apenas dois times da Série A não possuem acordos com essas empresas.
Entre os clubes com os maiores contratos, destacam-se:
- Flamengo (Pixbet) – R$ 470 milhões em patrocínio total
- Corinthians (Esporte da Sorte) – R$ 309 milhões em patrocínio total
Por outro lado, a presença das Bets em outras modalidades é significativamente menor. Apenas oito times da Liga Nacional de Basquete (LNB) possuem patrocínios do setor, sendo que a maioria está vinculada a clubes de futebol, como Vasco, São Paulo, Flamengo e Corinthians.
No vôlei feminino, o número é ainda menor: somente dois clubes contam com o apoio de casas de apostas, sendo um deles o Fluminense.
“Já teve vários booms de patrocínios no esporte: bebidas, veículos, bancos, só que isso parou. É preciso acordar para essa nova realidade. Eu acho interessante e positivo que novamente um setor privado tenha despertado o interesse em patrocinar o esporte. A começar pelo futebol. A gente sabe o quanto é duro manter o esporte olímpico no país. Esta seria uma contrapartida, uma forma de investir na base, no esporte feminino. E as empresas fazem porque é importante para a sua atividade, não é mais uma ajuda, um favor”, argumentou Manssur.
Acomodação das marcas
Com a regulamentação das apostas esportivas, Manssur acredita que o mercado está passando por um processo de acomodação, mas não se trata de uma bolha que estourará. Antes da regulamentação, o Brasil contava com cerca de 3 mil domínios de apostas operando sem regras claras. Agora, com o novo marco regulatório, o número caiu para 90 empresas registradas, cada uma podendo operar três marcas diferentes.
“Acho que teremos uma acomodação, não é uma bolha. Porque parece que estoura. Antes, o mercado não regulado não pagava imposto. Tinham cerca de 3 mil domínios de apostas no Brasil. Agora, com a regulamentação, são 90 CNPJs (cada uma com direito a três marcas). Imagino um processo que subiu e agora vai acomodar num nível razoável, num platô“, explicou Manssur.
Impactos
O advogado reconhece que a falta de regulamentação permitiu que o crescimento das apostas online ocorresse de maneira descontrolada, gerando impactos negativos, como o vício em jogos e o endividamento de apostadores. Ele acredita que a regulamentação ajudará a minimizar esses problemas, mas defende medidas adicionais.
“Como o Brasil vai reagir à regulamentação eu não sei. Faz três meses que entrou em vigor e a gente tem uma expectativa que ela irá minimizar muitos dos problemas que temos hoje. Mas, só a prática vai mostrar. E a regulamentação é um corpo vivo, sempre pode melhorar o que não está funcionando. Para mim, o maior problema é o endividamento e vício em jogo. Um contingente grande da população está sendo afetado por isso. Como mexer? Com publicidade esclarecedora, prévia, de jogo responsável, aliado a alguns mecanismos como proibição de apostas com cartão de crédito e, principalmente, a partir do mercado regulado, ter a interação com o serviço público de saúde para que possa atender o viciado e tratar como uma doença”, alertou Manssur.
Ele lembra que 88% do valor das apostas fica com as operadoras, enquanto apenas 12% vai para o governo. Deste montante, apenas 1% é destinado à Saúde, percentual que considera pequeno diante do impacto social das apostas.