Documento ressalta que a medida pode estimular a ludopatia e seria incentivo à atividade ‘de risco’
A Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) se posicionou de forma contrária ao Projeto de Lei apresentado pela Prefeitura de Belo Horizonte, que busca reduzir a alíquota do ISSQN (Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza) de 5% para 2% para empresas de apostas de quota fixa, conhecidas como bets.
O parecer técnico-jurídico, elaborado pelas Coordenadorias Estratégicas de Tutela Coletiva (CETUC) e de Promoção e Defesa das Crianças e Adolescentes (CEDEDICA), foi emitido a pedido da Comissão de Direitos Humanos, Igualdade Racial e Defesa do Consumidor da Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH).
Sumário
Incentivo a atividade de risco
De acordo com a análise da DPMG, a proposta representa um incentivo fiscal a um setor considerado de “alto risco social e econômico”, além de contrariar princípios constitucionais e normas federais que regem a atividade de apostas no Brasil.
O documento ressalta que a medida pode estimular a ludopatia, transtorno reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e agravar o superendividamento de famílias em situação de vulnerabilidade.
Dados do Banco Central, citados no parecer, apontam que em 2024 cerca de 5 milhões de beneficiários do Bolsa Família destinaram R$ 3 bilhões a apostas online em apenas um mês, comprometendo despesas básicas como alimentação e educação.
Impactos sociais e econômicos
A Defensoria alerta para o risco de privatização dos lucros e socialização dos prejuízos, já que os efeitos negativos da expansão das casas de apostas tendem a sobrecarregar o sistema público de saúde, a rede de assistência social e órgãos de segurança pública — sem contrapartida financeira prevista para reforçar esses serviços.
Divergência com a regulação federal
Outro ponto levantado é o descompasso entre a proposta municipal e a legislação nacional, consolidada pela Lei nº 14.790/2023 e regulamentações do Ministério da Fazenda. Essas normas priorizam políticas de redução de danos, proteção ao consumidor e restrição da publicidade dirigida a públicos vulneráveis, como crianças, adolescentes e idosos.
Para a Defensoria, conceder benefício fiscal às bets em nível municipal esvazia o esforço regulatório federal e estimula a expansão de um mercado de alto risco social.
Lei de Responsabilidade Fiscal
O parecer sustenta que a redução do ISSQN fere princípios constitucionais relacionados à proteção dos consumidores e à promoção da dignidade social. Além disso, aponta ausência de estudos de impacto orçamentário-financeiro, o que pode violar a Lei de Responsabilidade Fiscal, que exige estimativa de impacto e medidas compensatórias em casos de renúncia de receita.
Recomendação
Diante disso, a DPMG recomenda que a Câmara Municipal reavalie o projeto, levando em conta os riscos de violação a direitos fundamentais, a desproteção de grupos vulneráveis e a incongruência com a política nacional para o setor.
Assinam o parecer o coordenador estratégico de Tutela Coletiva, Paulo Cesar Azevedo de Almeida, e a coordenadora estratégica da Criança e Adolescente, Daniele Bellettato Nesrala.