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Justiça do Trabalho começa a julgar primeiros casos envolvendo apostas esportivas

  • Última modificação do post:9 de agosto de 2025
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Ações envolvem furtos, uso de equipamentos da empresa para jogos e debates sobre proporcionalidade das punições

A Justiça do Trabalho já começa a enfrentar as consequências da popularização das apostas esportivas e de outros jogos online. Um levantamento produzido pelo portal JOTA identificou, apenas em 2025, oito decisões relacionadas ao vício em bets. Sete processos tratavam de demissão por justa causa e um discutia suposta dispensa discriminatória.

De acordo com o relatório, em cinco dos sete casos de justa causa, a penalidade foi mantida. Em dois, houve reversão da decisão, sendo que em um deles foi determinada a reintegração do funcionário. No processo que discutia discriminação, o trabalhador não obteve êxito.

Magazine Luiza

No interior do Rio Grande do Sul, uma assistente de vendas do Magazine Luiza se aproveitou do acesso à tesouraria e ao fundo de troco da loja para subtrair R$ 53.618. Confrontada com imagens de câmeras de segurança, admitiu o crime e revelou o motivo: vício em bets.

Ela afirmou que, conforme perdia dinheiro, “foi se desesperando para conseguir devolver à loja”, o que a levou a fazer retiradas maiores. Duas semanas depois da confissão, com a auditoria concluída, foi demitida por justa causa.

O juiz Celso Fernando Karsburg, da 1ª Vara do Trabalho de Santa Cruz do Sul, concluiu que a funcionária tinha plena consciência da ilicitude dos atos e rejeitou a tese de ludopatia por falta de comprovação.

“Rompimento imediato do pacto laborativo porquanto causou a quebra da confiança necessária para a sua continuidade”, afirmou na decisão, condenando a ex-empregada a devolver o valor à empresa.

O processo tramita sob o número 0020040-34.2025.5.04.0731 no TRT4. Procurado pelo JOTA, o Magazine Luiza não se manifestou.

São Paulo concentra metade dos casos

O TRT2, em São Paulo, registrou quatro das oito decisões.

No processo 1001466-38.2024.5.02.0471, uma supervisora de cobrança induziu operadores a fazer apostas online, prometendo retornos acima da média de mercado, e autorizou o uso de celulares durante o expediente, o que era proibido. A 12ª Turma manteve a justa causa.

Para a relatora, desembargadora Tania Bizarro Quirino de Morais, “destruída a confiança que deve existir entre as partes”, não há desproporcionalidade na punição.

No processo 1000227-46.2025.5.02.0444, um funcionário de escritório de contabilidade foi acusado de passar o expediente apostando em “roletinha” e “tigrinho” e de acumular 17 atrasos em um mês.

O juiz Samuel Angelini Morgero afirmou que “Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador o ato de improbidade, a desídia no desempenho das respectivas funções e a prática constante de jogos de azar”.

Já no processo 1000868-67.2024.5.02.0606, um trabalhador de empresa de diaristas foi acusado de usar o computador da firma para apostar. A 2ª Turma manteve a dispensa.

O relator, desembargador Pérsio Luís Teixeira de Carvalho, destacou que “Quando o empregado, durante sua jornada de trabalho, faz uso de jogos de azar, há motivo suficiente para a demissão por justa causa, nos moldes do artigo 482, ‘l’, da CLT. Acessar sites que não tenham nada a ver com o conteúdo do trabalho também pode ser considerado motivo”.

No caso 1000272-34.2024.5.02.0202, houve reversão da justa causa. Uma funcionária que havia pedido demissão recebeu a penalidade posteriormente por supostas apostas. A 2ª Turma considerou que não houve gradação das penalidades e que a rescisão partiu da trabalhadora.

TRT15

No processo 0011069-84.2024.5.15.0118, um motoboy contratado por uma farmácia foi acusado de não prestar contas de trocos para apostar. O juiz manteve a justa causa, mas condenou a empresa a pagar R$ 2 mil de indenização por não comprovar ato de improbidade.

Já no processo 0010430-22.2024.5.15.0068, um ex-funcionário da indústria Granol alegou depressão grave e fobia social, afirmando que fez apostas online para evitar contato social. Ele buscava reverter a demissão como discriminatória, mas a Justiça entendeu que a empresa foi diligente e manteve a dispensa.

TRT17: reintegração e acordo

No Espírito Santo, no processo 0000029-11.2024.5.17.0002, um hotel demitiu por justa causa um funcionário acusado de vício em bets e de pedir empréstimos a colegas, enquanto estava em tratamento para depressão, ansiedade e síndrome do pânico.

O juiz Jedson Marcos dos Santos Miranda determinou a reintegração, entendendo que a dispensa ocorreu quando o empregado ainda estava inapto para trabalhar. Pouco depois, as partes fecharam acordo de R$ 40 mil, e o trabalhador não retornou às funções.

Especialistas explicam critérios

Segundo Gabriel Bazalia Sales, coordenador trabalhista do escritório Rayes e Fagundes, afirmou ao JOTA, “o empregado que é dispensado por justa causa, desde que devidamente fundamentada nas hipóteses previstas da CLT, tem direito apenas às verbas rescisórias mínimas”.

Para Elisa Afonso, sócia do RCA Advogados, “a jurisprudência tem reconhecido a validade da justa causa em situações bem documentadas e de efetiva gravidade, como nos casos em que há exposição pública da empresa de forma ofensiva, apropriação de valores para realização de apostas ou atos que violem o dever de boa-fé e lealdade”.

Gabriella Valdambrini, especialista em Direito Trabalhista Empresarial, explica que “se constatado que o ato infracional aconteceu, é preciso ter celeridade entre essa confirmação e a aplicação da pena. Porque, ao contrário, ocorre o que chamamos de perdão tácito”. Ela também ressalta que “dentro do contrato de trabalho, há a advertência verbal, a advertência por escrito, a suspensão e a justa causa. Então, temos uma variedade de penalidades que podem ser aplicadas ao empregado e ela deve observar o quão grave foi o ato praticado por ele”.

A jurista alertou que a empresa pode ser responsabilizada se tolerar ou incentivar apostas no ambiente de trabalho. “O dever legal da empresa é garantir um ambiente de trabalho saudável, tanto física quanto psicologicamente. Caso descumpra esse dever, ela pode ser responsabilizada civilmente por danos causados ao empregado”, concluiu.

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