De acordo com o especialista, país deve levar em conta sua importância na região e o tamanho do mercado que representa
Com a recente regulamentação do mercado de apostas no Brasil, surgiram novas oportunidades e desafios tanto para o cenário local quanto para a América Latina. Para aprofundar essa discussão, entrevistamos Renzo Escalante, que este ano recebeu um doutorado honorário da Cátedra Unesco, que compartilhou conosco suas perspectivas sobre o impacto dessas mudanças e o futuro do setor na região. Para ele, as regras propostas pelo país tem um efeito duplo: ao mesmo tempo em que proporcionam maior segurança jurídica para os investidores e aumentam a receita tributária, também levantam preocupações sobre a criação de um mercado paralelo como resultado de proibições excessivas.
Escalante, que é Diretor Regional de Marketing para a América Latina da WA Technology, enfatizou que o Brasil precisa se posicionar como líder regional, aproveitando o tamanho de seu mercado e promovendo uma legislação que incentive o crescimento sustentável. Ele também alertou para o risco de um modelo regulatório que, ao restringir demais, poderia afastar jogadores e empresas responsáveis, aumentando o mercado irregular.
“O jogo responsável é alcançado por meio da educação, não de prevenções rígidas. Proibições drásticas, sem funcionalidade, são prejudiciais a toda a cadeia trabalhista e econômica por trás desse setor. Vamos encarar o jogo sem medo. Nem todo jogo termina em dependência”, disse Renzo, que também é o fundador da Clases Play, a primeira escola profissional de jogos de azar da América Latina.
Em comparação com países como Colômbia e Argentina, o especialista ressalta que o Brasil deve buscar um equilíbrio, adotando práticas que protejam tanto o mercado quanto os jogadores, sem perder de vista o potencial de geração de receita para clubes e ligas esportivas. A criação de um ambiente regulado pode servir de exemplo para outras nações latino-americanas e fornecer uma base sólida para futuros mercados regulados.
“O Brasil, culturalmente, vive do esporte e o esporte precisa das apostas esportivas para continuar a crescer. Antes do surgimento das apostas, o patrocínio de clubes de futebol era escasso. Hoje, temos visto benefícios até mesmo no futebol feminino, que sempre foi ignorado”, disse ele.
Outro ponto levantado na entrevista foi a entrada de grandes operadoras internacionais no mercado brasileiro. Escalante acredita que, para maximizar os benefícios locais, o Brasil deve seguir o exemplo de países que priorizam a empregabilidade local, garantindo que a regulamentação favoreça o crescimento da economia e da força de trabalho nacional.
Confira a entrevista completa.
MediaBet – Qual é o impacto mais imediato da regulamentação no Brasil sobre o mercado local e regional?
O impacto é duplo. Um é muito positivo em termos de proporcionar segurança aos investidores no mercado, promover o turismo e gerar impostos que se traduzirão em ações para o mercado local.
O impacto negativo decorre da proibição de alguns elementos que deveriam ter sido acordados. O que é proibido gera um mercado paralelo ilegal e, com ele, práticas contrárias ao jogo responsável e seguro, como vemos em outras partes da região.
MediaBet – Como o modelo regulatório brasileiro se compara com o de outros países da América Latina, como Colômbia e Argentina?
Aqui (na América Latina) temos que olhar pelo modelo socialista/comunista, pois restrições não trazem um mercado saudável, não geram jogadores conscientes e acabam gerando prejuízos para todos.
O Brasil deve começar a olhar, a partir do consenso de sua legislação, a importância que tem na região, pelo tamanho do mercado que representa e entender que uma parte importante da cultura brasileira, aquela que conecta as pessoas, é baseada nos esportes que promovem e o esporte precisa de apostas não só para gerar emoção e conexão com os clientes das operadoras, mas também para ter renda como times, ligas e outros, que permitem que a indústria continue a se tecnificar. Vamos começar a olhar para o potencial positivo que isso traz, e não apenas para o outro lado.
MediaBet – Quais são os maiores desafios quando se trata de regulamentação em um país de dimensões continentais como o Brasil?
Entender que se trata de um mercado jovem e grande.
Entender o perfil psicológico do jogador em profundidade e ver que a restrição não é a resposta, mas sim gerar conscientização, uma cultura de jogo e facilidade de atendimento.
Consenso com as empresas para estabelecer pontos intermediários em que o mercado e o jogador não sejam afetados.
Observar a porcentagem de vício em jogos de azar no país e estabelecer medidas concretas, não populistas.
MediaBet – A regulamentação brasileira pode servir de modelo para outros países da América Latina que ainda não legalizaram o setor?
Definitivamente sim, porque é um grande mercado para o qual todos estão olhando. É um mercado jovem que todo mundo quer e é um mercado apaixonado em termos de jogos de azar, cujo público é desejado por todos os outros países da região. Portanto, o que foi feito e o que será feito serve de base para futuros mercados regulamentados e é nesse ponto que devemos prestar atenção, pois regulamentar não deve significar proibir, mas estabelecer vínculos em que todos ganhem.
MediaBet – Como a entrada de grandes operadoras internacionais pode afetar o mercado local e a geração de empregos no Brasil?
Isso é algo que deve ser regulamentado. Tomemos como exemplo o que o governo francês fez quando a Disney Paris foi criada. A primeira coisa que ele salvaguardou foi estabelecer um parâmetro de empregabilidade em que mais de 90% de seus trabalhadores deveriam ser franceses e não americanos. Se considerarmos esse exemplo, como muitos outros que existem por aí, eles são positivos para o crescimento local do mercado.
Entendo que agora com o trabalho remoto é possível estar presente sem estar fisicamente e que grandes empresas já têm suas equipes de trabalho formadas por operações em outros países, mas quem melhor do que um brasileiro para conhecer e se conectar melhor com pessoas do mesmo país.
MediaBet – Que inovações tecnológicas ou de mercado as novas regulamentações no Brasil preveem?
Dado o grande mercado jovem e tecnológico, é necessário implementar cassinos sociais, aqueles que não envolvem dinheiro para apostar, mas recompensas e isso, porque tem muitas formas de monetização a favor do empreendedor.
Outro elemento relacionado a isso é que ele dará mais profundidade às criptomoedas. Eu tenho restrições para jogar com a moeda local, então eu jogo dessa forma e sou pago da mesma maneira e, ao mesmo tempo, não haverá pagamento real de impostos, o que prejudica diretamente as ações sociais que são feitas com ela.
O uso de inteligência artificial e realidade aumentada para detectar um jogador com sinais de jogo patológico é algo que já está sendo estudado em outras partes do continente. Sem ir muito longe, é algo que nós da Play Advisors, a empresa de consultoria que eu presido, estamos investigando e, a partir daí, tendo esse conhecimento real do estado do jogador, podem ser implementadas estratégias comerciais para protegê-lo sem proibição. Quantos cassinos on-line na região implementaram centros de atendimento ao cliente com psicólogos que lidam com essas questões de dependência do jogo em relação aos jogadores: nenhum. E esse ponto é outro elemento que deve ser incluído nesse regulamento. Vamos aprender com o mercado presencial e suas leis, como as do Peru, da Colômbia e outras, em que um cliente de jogos de azar é colocado em uma lista e, portanto, tem seu acesso bloqueado por meio de seu documento de identidade. Tudo isso, visto que quantos apostadores temos… 1%, 2%? A regulamentação está sendo muito exagerada nessa questão.
MediaBet – Como você vê a possibilidade de colaboração entre os países da América Latina para criar uma estrutura regulatória mais harmonizada?
Difícil, mas deve acontecer. Temos o cenário para isso. Há várias cúpulas e tratados internacionais dos quais quase todos os países da região são membros, e por que não discutir essas questões? Compartilhamos aspectos sociais, econômicos e até mesmo culturais semelhantes, portanto, deveríamos falar sobre essas questões em nível global, com responsabilidade, mas sem medo de apostar.
Vamos considerar também que a maioria das grandes operadoras está em mais de um país da região e por que não agregar para começar a fazer esse eco que nos permite fazer parte de comissões nesse nível? Somos um setor que paga impostos, que gera empregos e que trata o jogo sem medo, cuidando dos jogadores, das operadoras e de toda a cadeia que gira em torno desse setor.