Antônio Geraldo da Silva, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, foi ouvido nesta quarta-feira (1) na CPI das Bets
“Ninguém ganha das bets”. A afirmação é do psiquiatra Antônio Geraldo da Silva, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, ouvido nesta quarta-feira (1), durante depoimento à CPI das Bets no Senado. Segundo o médico, o vício em apostas online é uma doença mental com os mesmos efeitos neuroquímicos das drogas, e que já afeta diferentes faixas etárias e classes sociais. Segundo ele, a ludopatia está em expansão no Brasil e impacta não apenas os indivíduos, mas também suas famílias.
“A ludopatia é uma doença que está se alastrando e prejudicando crianças, adolescentes, adultos, idosos e todos os seus familiares”, disse o médico. Ele explicou que esse tipo de dependência tem o mesmo mecanismo das adições químicas, sendo causada pela fissura, “um desejo incontrolável de jogar e apostar“, que leva o indivíduo a fazer “qualquer coisa” para manter o comportamento compulsivo.
De acordo com o psiquiatra, o perfil mais comum entre os apostadores é o de homens jovens de classes sociais mais baixas. No entanto, ele destacou que o apelo emocional das plataformas de apostas tem iludido um público cada vez mais amplo. “Essa é uma dependência que não se restringe a prejudicar a pessoa. Ela faz migração de classe social para baixo para famílias inteiras”, afirmou.
Durante sua fala, Antônio Geraldo citou casos emblemáticos que demonstram os impactos financeiros do vício. Um deles foi o de uma cozinheira que perdeu R$ 80 mil em apenas dois meses. “Vou repetir, perdeu 80 mil reais em dois meses”, reforçou. Ele também relatou o caso de uma estudante de direito de Santa Catarina que utilizou R$ 72 mil da verba de formatura da turma em apostas no jogo conhecido como “tigrinho”. “Ela pegou toda a economia dos colegas de turma e jogou tudo no tigrinho“, afirmou.
O presidente da associação fez um apelo direto à população para que não entre nesse tipo de ambiente digital. “A nossa recomendação é: não entre em jogos eletrônicos. Não inicie. Não acredite que você consegue parar, porque ninguém ganha das bets“, alertou. Ele ainda reforçou que “não existe nenhuma possibilidade de enriquecer com as bets” e que “não há chance de aliviar ansiedade jogando”. Segundo ele, o que começa como entretenimento se transforma rapidamente em dependência.
Antônio Geraldo também informou que uma proposta de regulamentação mais rígida está em construção, com base em legislações internacionais que buscam conter os danos causados pelas apostas online. “Estamos trabalhando numa regulamentação bastante severa, que copia muitas medidas de países que já estão lidando com isso”, afirmou. Entre as sugestões estão a limitação semanal de apostas e o uso de mecanismos como o bloqueio de pagamento via cartão de crédito.
Além do psiquiatra, a CPI das Bets ouviu também a diretora do Departamento de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Sônia Barros. Ela informou que um grupo de trabalho interministerial está estudando estratégias para enfrentar o problema. Segundo Sônia, o objetivo é atuar em três frentes: prevenção, redução de danos e suporte a indivíduos e comunidades afetadas.
“Estamos elaborando ações para oferecer suporte a pessoas e comunidades afetadas por práticas de jogo compulsivo“, explicou. O grupo inclui representantes de diferentes pastas e busca articular políticas públicas com foco na saúde mental e nos impactos sociais provocados pelo avanço do setor de apostas digitais.
